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Hotel Ruanda

Resenha escrita em março de 2015

Foto: divulgação do filme

Resenha: Hotel Ruanda

 

Muito se comenta sobre os conflitos na África, porém pouco se debate sobre as origens desses confrontos. A verdade é que existe uma grande ignorância mundo afora no que se refere ao continente africano. Muita gente acredita que a miséria e as guerras na África são endêmicas e que, portanto, sempre existiram. Dessa forma, países de outros continentes não teriam a mínima responsabilidade com esses problemas. Não é bem assim.

Ruanda é um pequeno país localizado na região centro-oriental do continente africano. Tal região já foi dominada durante um período pela Alemanha, mas, ao fim da Primeira Guerra Mundial, com a derrota alemã, a Bélgica assumiu o controle do território e estabeleceu uma colônia no local. Os belgas escolheram uma etnia minoritária chamada tutsi para administrar o território ruandês. Dessa forma, a etnia hutu, majoritária, acabou sendo relegada e inferiorizada perante os tutsis. Em 1962, Ruanda seria declarada independente da Bélgica, contudo, a essa altura, já havia um clima de tensão entre essas duas etnias, que se arrastou durante décadas. Até que em 1994, devido a boatos, discursos de ódio, atentados (inclusive um que derrubou o avião com o presidente do país) e ânimos acirrados envolvendo grupos extremistas, um conflito sangrento eclodiu em Ruanda, chegando a vitimar por volta de 800 mil pessoas. É importante ressaltar que antes da presença europeia em Ruanda, hutus e tutsi compartilhavam de tanta proximidade que conviviam pacificamente.

O filme Hotel Ruanda, dirigido por Terry George e protagonizado por Don Cheadle, foi lançando em 2004 e mostra um pouco do drama que foi o genocídio vivido no país. O longa-metragem acompanha o personagem Paul Rusesabagina, interpretado por Cheadle, e seu esforço em abrigar refugiados, tropas da ONU e turistas durante o conflito. Paul Rusesabagina é um personagem real e o filme é baseado em sua experiência como gerente do Hotel Mille Collines, onde ele abrigou os refugiados. Paul pertence a etnia hutu e é casado com Tatiana (interpretada por Sophie Okonedo), que é tutsi. Percebe-se a preocupação do diretor em mostrar como é lamentável a segregação entre as duas etnias, principalmente porque ambas têm muito em comum.

Conforme grupos militares e paramilitares hutus ampliam a perseguição aos tutsis, o número de refugiados no hotel gerenciado por Paul vai aumentando vertiginosamente. Durante a trama, o espectador acompanha a dificuldade e o esforço de Paul na tentativa de ajudar o maior número possível de pessoas, incluindo sua família e amigos. O filme também explicita a má vontade da comunidade internacional em ajudar o povo africano. Mesmo países que tiveram responsabilidade pela condição conflituosa do país, como a Bélgica, se eximiram do esforço em resolver a situação. A colaboração de países ricos se restringiu a envios de tropas para retirar seus próprios cidadãos que estavam em solo ruandês.

Foto: cena do filme

Hotel Ruanda recebeu três indicações ao Oscar: melhor roteiro original, melhor ator (Don Cheadle) e melhor atriz coadjuvante (Sophie Okonedo). Como já é de se esperar de um drama que trata de assuntos tão fortes, o filme conta com cenas impactantes e atuações magníficas, comovendo o espectador. Traz uma reflexão, em especial para o público de países influentes, sobre como a África é vista e sobre como as relações humanas e culturais podem afetar diversos povos.

O conflito só foi perdendo força conforme grupos de resistência tutsi passaram a vencer batalhas e quando outros países (finalmente) começaram a ceder ajuda e abrigo para refugiados.

Embora isso não seja retratado no filme, o fato é que a Europa e as grandes potências mundiais estavam mais preocupadas com outro conflito que estava ocorrendo concomitantemente: a guerra na Bósnia. Após o fim do conflito em Ruanda, vários países assumiram, de alguma forma, que foram negligentes para com os ruandeses. Os Estados Unidos, por exemplo, ofereceram ajuda financeira para a reconstrução do país.

Após o fim do genocídio e consecutiva ajuda internacional, Ruanda foi aos poucos se reestruturando e hoje, embora ainda viva numa espécie de autocracia, tem bons níveis de desenvolvimento. A distinção entre hutus e tutsi é atualmente desencorajada.

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